Breve história do crescimento urbano de São Paulo por Caio Prado Jr.
“As residências burguesas ou médias, que, até fins do século passado [século XIX], nesta insignificante cidade que mais não era então São Paulo, se confundiam com o centro comercial, destacavam-se quando o crescimento da atividade urbana já não comportava mais residências em pleno centro. É lá por 1880 que se formam os primeiros bairros propriamente residenciais; e vamos notar que, ao contrário dos bairros operários, que se estabelecem nos terrenos mais ingratos das baixadas do Tietê e do Tamanduateí, as residências burguesas se fixam nas alturas do maciço. Localizam-se, a princípio, contíguos ao centro, para o lado do Tietê, isto é, na direção norte; e daí vão acompanhando o bordo inferior do maciço, pouco acima da linha em que começa a baixada do rio. É aí que se instala o bairro de Santa Ifigênia, com suas residências aristocráticas de fins do século passado, que se prolongam depois pelos Campos Elísios. Para o outro lado da cidade, isto é, nos pontos mais levados desta vertente do maciço, parecem primeiro as chácaras, cujos parques e jardins vão sendo loteados e substituídos aos poucos por verdadeiros bairros urbanos compactos. É o caso da Consolação; depois, seguindo a antiga estrada do Vergueiro, a Liberdade; e já no alto do espigão mestre do maciço, a Vila Mariana.
Em princípios do século atual [século XX], os bairros residenciais lançam-se decididamente pelo flanco do maciço, subindo-lhe as encostas à procura de terrenos mais altos e saudáveis; é a vez de Higienópolis, que será o bairro da aristocracia paulista das fortunas saídas do café. E subindo sempre, as residências alcançam o alto espigão, onde se instala, acompanhando-o fielmente, a Avenida Paulista. Já então a progressão cafeeira se interrompera, as novas fortunas saem da indústria do comércio, quase todo em mãos de estrangeiros, imigrantes enriquecidos nesta Canaã americana: A Avenida Paulista será o bairro residencial dos milionários desta nova fase da economia paulista, estrangeiros ou de recente origem estrangeira quase todos. E a arquitetura do bairro o dirá bem claramente.
Da Avenida Paulista, pelas escarpas abruptas que demandam a várzea do Pinheiros, descem novos bairros. E a própria várzea começa a ser ocupada; já não , como foi o caso de suas irmãs do Tietê e do Tamanduateí, por populações operárias, mas pela mesma burguesia de Higienópolis e da Avenida Paulista. Inaugura-se tal ocupação por esta obra-prima de urbanismo que é o Jardim América, iniciado em 1910. A designação ficará, e os bairros da várzea do Pinheiros serão todos “jardins”: Jardim Paulista, Jardim Europa. Jardins no nome e no aspecto: vegetação profusa, amplos espaços livres, construções isoladas em meio de grandes parques. Será este o recanto mais pitoresco de São Paulo; o seu caráter se afasta completamente dos modelos urbanísticos que herdamos do passado, e traz um cunho acentuadamente anglo-saxão que lhe imprimiu a empresa daquela origem que lançou este tipo de urbanismo depois largamente imitado.”
In Caio Prado Jr., A ciade de São Paulo: Geografia e história. Editora Brasiliense, 1983, p. 68-70
Post enviado por Gabriel Kogan
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